quarta-feira, 31 de março de 2010

Porque adoro o que faço

A infância é um território mágico. Todos por lá passámos um dia e ficámos por ele marcados, para o bem e para o mal, ao longo das nossas vidas.
É um tempo de sonho e de descoberta, de interrogação e de assombro. A nossa memória mergulha raízes nesse tempo, único e irrepetível, que somos chamados a revisitar sempre que pensamos nos valores, nas lembranças e nos princípios que nos formaram e estruturaram.
Quem educa lidando com a infância, educa para a vida, para a relação com os outros, para a criatividade, para a solidariedade e para a tolerância, para o afecto e para a partilha da alegria, para a cidadania e para a responsabilidade individual. Prolonga o espaço afectivo da família, é uma luz doce que se acende no horizonte diário de quem se descobre, descobrindo a vida. É uma ponte, um abraço, uma claridade que quotidianamente se renova e que, muitas vezes, ajuda quem cresce a superar as sombras pesadas da tristeza, da solidão e do abandono.
Quem educa as crinaças, num tempo de inquietação e de dúvida, de incerteza e crise, educa muito para além dos limites comuns do próprio acto de educar.
Educa para tudo o que há-de vir, para o previsível e para o imprevisível e fá-lo em nome dos valores que não dependem de modas nem de ciclos de gostos.
Educa para que, um dia, falando da infância e parafraseando um verso de Ruy Belo, muitos possam dizer:
"E tudo era possível, era só querer."

Eu e a minha mamã


"A minha Mamã é especial,
a melhor que se pode ter.
E eu quero ser como ela...
um dia, quando crescer!"
A Mamã do Urso Bebé é esperta e habilidosa! Sabe fazer tudo: rugir, patinar e nadar como um peixe, e nem sequer tem medo do escuro...

Hoje li esta história aos meninos da sala dos 2 anos e não sei quem gostou mais, se eles, se eu...
Para além da história se centrar no afecto único e especial entre mãe e filho, este livro é dotado de uma ilustração cheia de encanto e beleza.
Livro seleccionado para o Plano Nacional de Leitura, um optimo presente para o Dia da Mãe.




terça-feira, 30 de março de 2010

Through your eyes

É nos teus olhos que o mundo inteiro cabe,
mesmo quando as suas voltas me levam para longe de ti;
e se outras voltas me fazem ver nos teus os meus olhos,
não é porque o mundo parou,
mas porque esse breve olhar nos fez imaginar
que só nós é que o fazemos andar.

 
Nuno Júdice

segunda-feira, 29 de março de 2010

That's it

Just a smile...

Eu gostaria ainda de falar
da rosa brava e do mar.
A rosa é tão delicada,
o mar tão impetuoso,
que não sei como os juntar
e convidar para o chá
na casa breve do poema.
O melhor é não falar
sorrir-lhes só da janela.

Eugénio de Andrade

domingo, 28 de março de 2010

Enquanto


Enquanto houver uns olhos que reflectem
outros olhos que os fitam,
enquanto a boca responda a suspirar
aos lábios que suspiram,
enquanto sentir-se possam ao beijar-se
duas almas confundidas,
enquanto exista uma mulher formosa,
haverá poesia!
Se receoso se turba na alta noite teu peito em flor,
ao sentires um hálito em teus lábios,
abrasador,
lembra-te que invisível ao teu lado
respiro eu.

Gustavo Adolfo Bécquer

Sem véu


Para atravessar contigo o deserto do mundo
Para enfrentarmos juntos o terror da morte
Para ver a verdade para perder o medo
Ao lado dos teus passos caminhei
Por ti deixei meu reino meu segredo
Minha rápida noite meu silêncio
Minha pérola redonda e seu oriente
Meu espelho minha vida minha imagem
E abandonei os jardins do paraíso
Cá fora à luz sem véu do dia duro
Sem os espelhos vi que estava nua
E ao descampado se chamava tempo
Por isso com teus gestos me vestiste
E aprendi a viver em pleno vento

Sophia de Mello Breyner

sexta-feira, 26 de março de 2010

Read me


Uma voz na pedra



Não sei se respondo ou se pergunto.
Sou uma voz que nasceu na penumbra do vazio.
Estou um pouco ébria e estou crescendo numa pedra.
Não tenho a sabedoria do mel ou a do vinho.
De súbito, ergo-me como uma torre de sombra fulgurante.
A minha tristeza é a da sede e a da chama.
Com esta pequena centelha quero incendiar o silêncio.
O que eu amo não sei. Amo. Amo em total abandono.
Sinto a minha boca dentro das árvores e de uma oculta nascente.
Indecisa e ardente, algo ainda não é flor em mim.
Não estou perdida, estou entre o vento e o olvido.
Quero conhecer a minha nudez e ser o azul da presença.
Não sou a destruição cega nem a esperança impossível.
Sou alguém que espera ser aberto por uma palavra.

António Ramos Rosa

quarta-feira, 24 de março de 2010

É só um olhar


Não, não é ainda a inquieta
luz de março
à proa de um sorriso,
nem a gloriosa ascensão do trigo,
a seda duma andorinha roçando
o ombro nu,
o pequeno e solitário rio adormecidona garganta;
não, nem o cheiro acidulado e bom
do corpo, depois do amor,
pelas ruas a caminho do mar,
ou o despenhado silêncio
da pequena praça,
como um barco, o sorriso à proa;
não, é só um olhar.

Eugénio de Andrade

terça-feira, 23 de março de 2010

A outra metade


"Que as palavras que eu falo
Não sejam ouvidas como prece e nem repetidas com fervor
Apenas respeitadas
Como a única coisa que resta a um homem inundado de sentimentos
Porque metade de mim é o que ouço
Mas a outra metade é o que calo.
Que essa minha vontade de ir embora
Se transforme na calma e na paz que eu mereço
Que essa tensão que me corrói por dentro
Seja um dia recompensada
Porque metade de mim é o que eu penso mas a outra metade é um vulcão."

Oswaldo Montenegro

Na Primavera


Não tenhas medo do amor.
Pousa a tua mão devagar sobre o peito da terra e sente respirar no seu seio os nomes das coisas que ali estão a crescer:
o linho e genciana; as ervilhas-de-cheiro e as campainhas azuis;
a menta perfumada para as infusões do verão e a teia de raízes de um pequeno loureiro que se organiza como uma rede de veias na confusão de um corpo.
A vida nunca foi só Inverno, nunca foi só bruma e desamparo.
Se bem que chova ainda, não te importes:
pousa a tua mão devagar sobre o teu peito e ouve o clamor da tempestade que faz ruir os muros:
explode no teu coração um amor-perfeito, será doce o seu pólen na corola de um beijo, não tenhas medo, hão-de pedir-to quando chegar a primavera.

segunda-feira, 22 de março de 2010

Thrive


And then the day came,
when the risk
to remain tight
in a bud
was more painful
than the risk
it took
to blossom.

Anaïs Nin

Não posso adiar o coração


Não posso adiar o amor para outro século
não posso
ainda que o grito sufoque na garganta
ainda que o ódio estale e crepite e arda
sob as montanhas cinzentas
e montanhas cinzentas
Não posso adiar este braço
que é uma arma de dois gumes amor e ódio
Não posso adiar
ainda que a noite pese séculos sobre as costas
e a aurora indecisa demore
não posso adiar para outro século a minha vida
nem o meu amor
nem o meu grito de libertação
Não posso adiar o coração.

( António Ramos Rosa )

sábado, 20 de março de 2010

A voar...

Painter: Frank Gonzales

10 meses já passados...


Os fatídicos dias 20 são como um derreter da vida que eu derreto na cama...
Sem vontade de nada, fico somente a existir.
Penso nos tempos passados, nos sorrisos e nas conversas.
Penso, mas não processo o pensamento.
Não quero decifrar a falta que me fazes, não quero apurar que nesta vida nada mais poderei partilhar contigo...
O fatídico dia 20 que te levou, leva-me também da realidade, agora só quero voar...



quinta-feira, 18 de março de 2010

o que é a sensualidade?

Sensualidade significa que você está aberto, pronto para pulsar com a existência. Se um pássaro começa a cantar, a pessoa sensual sente, no mesmo instante, a canção ecoar no âmago do seu ser. A pessoa que não é sensual não ouve nada, ou talvez escute só um barulho. A canção não penetra em seu coração.
Um cuco começa a cantar — uma pessoa sensual não sente como se o pássaro estivesse cantando de um mangueiral, mas sim dos recônditos de sua própria alma. O canto do cuco transforma-se no canto da própria pessoa, passa a ser seu próprio anseio divino. Nesse momento, o observador e o observado são um só. Ao ver uma flor desabrochando, uma pessoa sensual desabrocha com ela.
Uma pessoa sensual é líquida, fluente, fluida. A cada experiência, ela torna-se essa experiência. Ao contemplar o pôr-do-sol, se torna o pôr-do-sol. Ao contemplar uma noite sem lua, de uma escuridão silenciosa e bela, ela se torna a escuridão.
Pela manhã, se torna a luz. Ao ouvir uma música, ela é a música; ao ouvir o barulho da água, ela se torna esse barulho. E, quando o vento passa pelo bambuzal, estalando os bambus... ela não está longe deles. Está entre eles, em cada um deles — ela é o bambu.
Ela é tudo o que a vida é. Saboreia a vida em todos os seus meandros. Isso a torna uma pessoa rica: essa é a verdadeira riqueza.
Ser sensual é estar aberto aos mistérios da vida. Seja cada vez mais sensual e deixe de lado todas as condenações. Deixe que o seu corpo se torne uma porta.

Osho, em "Corpo e Mente em Equilíbrio"

quarta-feira, 17 de março de 2010

Milagres


Viemos da água, somos água, e só seremos terra, pó, quando secarmos.
Cabe-nos não nos deixarmos minguar, secar, antes que o fio do tempo nos dite a morte.
Compete-nos abrir as comportas da água interior, soltar o sangue, o sonho, libertar o coração:
"Milagre é o rio não findar mais. Milagre é o coração começar sempre no peito de outra vida".

Mia Couto

Ler o coração...


Palavras para quê?


terça-feira, 16 de março de 2010

Num abrir e fechar de mãos




Às vezes é preciso abandonar a vida que planeámos para viver a vida que nos espera.

Num ápice, a nossa vida altera-se para sempre.
Muda o rumo dos nossos sonhos.
Elimina tudo o que esperávamos.


E depois?


"Às vezes as melhores lições aprendem-se depois de um momento de desalento.
As pessoas que sobrevivem ao desalento da alma e do coração são muitas vezes as mais interessantes e evoluídas do mundo."

Tammy Kling


domingo, 14 de março de 2010

Gustav Klimt





Klimt disse: "A ornamentação enriquece o real".



Whispers



Quando estás em silêncio, o teu potencial fala contigo, sussurra-te ao ouvido.
E esses sussurros são absolutamente categóricos — não há "se", nem "mas".
O coração não conhece "se" e "mas".
Simplesmente, diz-te que este é o teu destino:
tornares-te pintor ou poeta ou escultor ou dançarino ou músico.
Ele simplesmente diz-te que é assim que te realizarás.
Ele começa a direccionar-te.


sábado, 13 de março de 2010

Balões de oxigénio


Quem faz um poema abre uma janela.

Respira, tu que estás numa cela abafada,
esse ar que entra por ela.
Por isso é que os poemas têm ritmo
para que possas profundamente respirar.

Quem faz um poema salva um afogado.

 
Mário Quintana



sexta-feira, 12 de março de 2010

Ilusão


Em todas as ruas te encontro
Em todas as ruas te perco
conheço tão bem o teu corpo
sonhei tanto a tua figura
que é de olhos fechados que eu ando
a limitar a tua altura
e bebo a água e sorvo o ar
que te atravessou a cintura
tanto, tão perto, tão real
que o meu corpo se transfigura
e toca o seu próprio elemento
num corpo que já não é seu
num rio que desapareceu
onde um braço teu me procura
Em todas as ruas te encontro
Em todas as ruas te perco

(Mário Cesariny)

Poesia


Que a poesia encha o teu dia
Que o teu dia encha a poesia
Que o teu dia e a poesia te encham de alegria.


quinta-feira, 11 de março de 2010

Holocausto

Não há nada e há tudo


Na minha cabana de bambu de dez pés
essa primavera,
não há nada:
Tem tudo.
(Autor: Sodo)

Apenas visualize-se um mestre no seu próprio direito, na sua cabana de bambu de dez pés.
A primevera chegou; não há nada e há tudo...
A experiência final da meditação é: numa mão não há nada; na outra mão tem-se o universo inteiro.
Perde-se a antiga identidade; eis porque parece que não haver nada.
Contudo, ganha-se uma nova identidade – assim, sente-se que se tem tudo.
Ambas são experiências autênticas.

(Palavras de Osho)

quarta-feira, 10 de março de 2010

Voa


As aves
afluem à margem
jogam como se a água
lhes pertencesse,
pousam no meio
dos arbustos como
se tivessem todo o tempo!
No entanto
sabem que as nuvens vão
encher o céu;
e que o norte irá enviar
o vento frio que as há-de
arrastar para sul,
deixando atrás de si
o silêncio nos campos.
Mas pouco lhes importa isso
quando se juntam,
e cantam a efemeridade do instante.

( Nuno Júdice )

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