terça-feira, 27 de setembro de 2011

27 de Setembro de 2011


Hoje, as flores têm uma cor especial e o seu perfume exala no ar,
os pássaros cantam mais e mais alto,
o sol brilha com uma nova força e calor
e nesta noite,
as estrelas cintilam e sorriem pela chegada da Isis ao mundo.

Bem-vinda, meu amor !


Pensar é transgredir



O amor é uma escultura que se faz sozinha.
É uma flor inesperada sem estação do ano para surgir nem para morrer.
Vai sendo esboçada assim ao léu: aqui a sobrancelha se arqueia, ali desce a curva do pescoço, a mão toca a ponta de um pé, no meio estende-se a floresta das mil seduções.
Imponderável como a obra de arte, o amor nem se define nem se enquadra: é cada vez outro, e novo, embora tão velho.
Intemporal.
Planta selvagem, precisa de ar para desabrochar mas também se move nos vãos mais escuros... foge de qualquer sensatez, como o perfume das maçãs escapa num cesto de vime tampado.
Se fossemos sensatos haveríamos de procurar nem amar, amar pouco, amar menos, amar com hora marcada e limites.
Mas o amor, que nunca tem juízo, nos prega peças quando e onde menos esperamos.
Nunca nos sentimos tão inteiros como nesses primeiros tempos em que estamos fragmentados: tirados de nós mesmos e esvaziados de tudo o mais, plenos só do outro em nós.
Nos sentimos melhores, mais bonitos, andamos com mais elegância, amamos mais aos amigos, todo mundo foi perdoado, nosso coração é um barco para o qual até naufragar seria glorioso (ah, que naufrágios...).
Mais que isso, nesse castelo – como em qualquer castelo – não pode haver dois reis.
Quem então cederá seu lugar, quem será sábio, quem se fará gueixa submissa ou servo feliz, para que o outro tome o lugar e se entronize e... reine?
A palavra "liberdade" teria de ser a mais presente, porém é a mais convidada a discretamente afastar-se e permitir que em seu lugar assuma o comando alguma subalterna: tolerância, resignação, doação, adaptação.
Rondando o fosso do castelo, a vilã de todas: a culpa.
Quem deixou sobre minha mesa um bilhete dizendo "Se você ama alguém, deixe-o livre" sabia das coisas, portanto sabia também o desafio que me lançava.
No mundo das palavras há tantos artifícios quantas são as nossas contradições.
Por isso, conviver é tramar, trançar, largar, pegar, perder, e nunca definitivamente entender o que – se fossemos um pouco sábios – deveríamos fazer.
Farsa, tragédia grega ou dramalhão mexicano, às vezes comédia de mau gosto, outras soneto perfeito:
o amor, como as palavras, se disfarça em doces armadilhas ou lâminas mortais.

Lya Luft

segunda-feira, 26 de setembro de 2011

Project for a Fainting


Oh yes, the rain is sorry, of course,
the rain is with her painted face still plain and
with such pixel you’d never see it in the pure freckling,
the lacquer of her.
The world is lighter with her recklessness,
a handkerchief so wet it is clear.
To you.
My withered place, this frumpy home
(nearer to the body than to evening)
miserable beloved.
I lie tender and devout with insomnia,
perfect on the center pillow past midnight,
sick with the thought of another year of waking,
solved and happy, it has never been this way!
Believe strangers who say the end is close for what could be closer?
You are my stranger and see how we have closed.
On both ends.
Night wets me all night, blind, carried.
And watermarks.
The plough of the rough on the slick, love, a tendency toward fever.
To break. To soil.
Would I dance with you? Both forever and rather die.
It would be like dying, yes.
Yes I would.


Brenda Shaughnessy

sexta-feira, 23 de setembro de 2011

Entre a pele de dentro e a pele de fora


Esta manhã acordei vaga
e imensa como uma cidade desabitada.
Acordei céu de luar
sitiada pelo deserto da noite
e sou a bruma indissolúvel
envolvente etéreo de nada
num universo de nebulosas.

Sou bruma e penso em símbolos
de horas naufragantes insulares
de mim acordando só bruma
da bruma a acordar em mim
eu inexacta como a linguagem lenta das sombras.

De resto nada
infinitamente nada.

Pura circulação de nada meus rios em meu leito
minhas veias entre eu e mim
em trânsito contínuo para ser outro e ser o mesmo
para meditar o intervalo vazio
entre a pele de dentro e a pele de fora.

(Paulo Renato Cardoso)

quinta-feira, 22 de setembro de 2011

My weak spot


“Everyone has their weak spot. The one thing that, despite your best efforts, will always bring you to your knees, regardless of how strong you are otherwise.”

Sarah Dessen, in 'Lock and Key'

domingo, 18 de setembro de 2011

Windmills of my mind


On this windy day, a gust of understanding blowed in my mind.
If somethings are beyond our will, no matter how hard you try to change them, it won't pay the effort.
Even if you make the strenght to stop the windmill from running, the wind will eventually win you.
Someone once said that we must known the wisdom to bend ourselves, like the river grass bends to the wind.
I didn't see it then, but this is so true.
I won't struggle no more, I'll be accepting my heart and trying my best, despite of the wind that blows round and round again.
 

sábado, 17 de setembro de 2011

Borboletas


Hoje, prefiro cantar as coisas simples, as que
crescem depressa, como os ciprestes, ou as
que se enrolam a tudo o que aparece nos muros
como as buganvílias. Através delas, vejo o céu
que me traz outras coisas, mais complicadas
dos que estas da terra; e também no céu
escolho, hoje, o que não é difícil, a nuvem
que há pouco parecia eterna e desapareceu;
ou um branco sujo que apagou o horizonte,
por algum tempo, e fez com que todo o
universo ficasse ao meu alcance para nada.

Mas o que é simples também pode ser o
seu contrário. Há uma lógica no interior
deste movimento que faz crescer o cipreste,
ou empurra a buganvilia para o fundo do muro;
e também as nuvens seguem uma direcção
precisa, mudando a sua forma à medida que
se afastam dos meus olhos. A verdade deste
mundo encontra-se no próprio acaso que
a determina; e sou eu que tenho de encontrar
as razões para o que não precisa delas,
porque a sua existência se limita a este
perfume de fim de verão, ou à queda
das folhas que se confundem com nuvens.

O mundo é imprevisível como a vida
da borboleta que nasceu de dentro da
buganvilia; mas o vento que há pouco soprava,
não me disse nada sobre isso, nem o seu
sopro vago me libertou de folhas e de
nuvens, para que o chão e céu ficassem
limpos. Só a borboleta, no instante do voo,
trouxe a sua luz dissonante para dentro
da natureza; e foi ao encontrá-la,
no meio da terra e das pedras do jardim,
que me apercebi de que nem tudo é simples,
quando a morte se cruza com a beleza.

Nuno Júdice

quinta-feira, 15 de setembro de 2011

A hora H


Vem quando o vento acorda os meus cabelos,
como em folhagem que,
ávida respira...
Vem como a sombra,
quando a estrada é nua
Num risco de asa,
vem, serenamente
Como as estrelas, quando não há lua
Ou como os peixes, quando não há gente...

Pedro Homem de Mello

At the bank of the river


And quiet flows the river
without a ripple or shiver
trees stand windless
not even a whiff in space
no leaf shakes, no sound;
fishes are sleeping
sweating fishermen around
have lost all zeal
in the act of rowing;
their boats stand still.
Stilled water looks like a mirror
naked boy in it looks at his figure.
The world without a name
halts at the bank of the river
no one knows when it came
none knows if it was there.

Aju Mukhopadhyay



domingo, 11 de setembro de 2011

Eco


Tiro-te do espelho; 
e à minha frente és o reflexo que imagino,
num pedaço de realidade.
Mas se tento tocar-te,
é o vidro que me impede de passar
para onde estás,
num eco de desejo.
 
Nuno Júdice

quinta-feira, 8 de setembro de 2011

Para eu não esquecer.


Quando fazemos tudo para que nos amem e não conseguimos, resta-nos um último recurso: não fazer mais nada. Por isso, digo, quando não obtivermos o amor, o afecto ou a ternura que havíamos solicitado, melhor será desistirmos e procurar mais adiante os sentimentos que nos negaram.
Não fazer esforços inúteis, pois o amor nasce, ou não, espontaneamente, mas nunca por força de imposição. Às vezes, é inútil esforçar-se demais, nada se consegue; outras vezes, nada damos e o amor se rende aos nossos pés. Os sentimentos são sempre uma surpresa. Nunca foram uma caridade mendigada, uma compaixão ou um favor concedido. Quase sempre amamos a quem nos ama mal, e desprezamos quem melhor nos quer. Assim, repito, quando tivermos feito tudo para conseguir um amor, e falhado, resta-nos um só caminho... o de mais nada fazer.

Clarice Lispector

terça-feira, 6 de setembro de 2011

Tenho um amigo


Conheci um amigo num dia em que tudo me corria às avessas. Fui surpreendida por um enorme piropo e por um acaso que me deixou desconcertada. Os acasos sucedem-se na minha vida, não os que desejo, mas os que não se anunciam de forma nenhuma. Este amigo tem 81 anos e já vi o meu dia irrompido com as suas palavras pela terceira vez. Mesmo sendo céptica, acho que "algo" brinca comigo, de uma forma pouco comum.
Hoje, encontrei-o e perguntei, como a pergunta mais banal de se perguntar, se estava tudo bem. Sentou-se na minha mesa e conversámos, penso que apenas por uns breves instantes, mas que chegaram para que me contasse o que essencialmente percebi ser a sua solidão. Perdeu a esposa há 2 anos e o único filho está no estrangeiro, só vem de vez em quando... Perdi-me no tempo, na súbita ternura que senti e, como tenho uma curiosidade aguçada, perguntei-lhe porque se vestia com roupas claras, quando geralmente se perde um ente querido as pessoas se vestem de escuro. Ele respondeu que, para triste bastava ele, assim para os outros, ele seria menos triste. E sorriu com um sorriso triste.
Quando me levantei, porque e somente o dever me chamava, disse-lhe que tinha ali uma amiga e quando se tem um amigo sentimo-nos menos sós, mas creio que sou eu que tenho ali um amigo...
Fiquei grande parte da tarde a pensar na ironia do seu nome, na sua tristeza (que quis erradicar...), no tema da amizade que brota de onde menos se espera. E no eco das suas palavras - A vida é mesmo um palco, onde todos encarnamos os nossos papéis sociais e vivemos para a aparência do que é esperado que sejamos. Vestimos tantas vezes essa indumentária que já não sabemos diferenciar a máscara da nossa própria pele. Saberemos mesmo qual é a nossa matriz? E a realidade é real ou serão os nossos sonhos a parte mais real de nós?
Não, não quero isso para mim. Posso ser criticada, posso ser diferente, incompreendida, mas não quero fazer parte do elenco. Não quero correntes, a não ser as correntes do amor. Não quero vendas nos olhos, a não ser a venda da saudade. Não quero meias-alegrias, meias-tristezas, meias-palavras, meios-poemas... nem o meio termo quero. Só quero poder sonhar, sem reservas. Ainda que me magoe, ainda que nada corresponda, são os meus sonhos e fazem parte do mais real em mim...

segunda-feira, 5 de setembro de 2011

When I'm awake, when I'm asleep


Acordo com o teu nome nos
meus lábios — amargo beijo
esse que o tempo dá sem
aviso a quem não esquece.

Maria do Rosário Pedreira

 

sexta-feira, 2 de setembro de 2011

De cabeça para baixo

Final do dia
(...afinal foi assim...):
Bem previsto - eu sabia que, de alguma forma, acabaria o dia de cabeça para baixo, só não previ que fosse como o mito da avestruz...


quinta-feira, 1 de setembro de 2011

Aegrescit medendo...


Obtive uma noção: tenho sobre ti, que com os olhos desarmados vês só o luzir da vidraça, uma vantagem positiva. Se agora, em vez destes vidros simples, eu usasse os de meu telescópio, de composição mais científica, poderia avistar além, no planeta Marte, os mares, as neves, os canais, o recorte dos golfos, toda a geografia de um astro que circula a milhares de léguas dos Campos Elísios. É outra noção, e tremenda!
Tens aqui, pois, o olho primitivo, o da natureza, elevado pela Civilização à sua máxima potência da visão. E desde já, pelo lado do olho, portanto, eu, civilizado, sou mais feliz que o incivilizado, porque descubro realidades do universo que ele não suspeita e de que está privado. Aplica esta prova a todos os órgãos e compreende o meu princípio.
(...)
Que lhes importava a eles que um de nós fosse Jacinto, outro Zé? Eles tão imensos, nós tão pequeninos, somos a obra da mesma vontade. E todos, Uranos ou Lorenas de Noronha e Sande, constituímos modos diversos de um ser único, e as nossas diversidades esparsas somam na mesma compacta unidade. Moléculas do mesmo todo, governadas pela mesma lei, rolando para o mesmo fim... Do astro ao homem, do homem à flor do trevo, da flor do trevo ao mar sonoro - tudo é o mesmo corpo, onde circula como um sangue, o mesmo deus. E nenhum frêmito de vida, pormenor, passa numa fibra desse sublime corpo, que se não repercuta em todas, até às mais humildes, até às que parecem inertes e invitais. Quando um sol que não avisto, nunca avistarei, morre de inanição nas profundidades, esse esguio galho de limoeiro, embaixo na horta, sente um secreto arrepio de morte; e, quando eu bato uma patada no soalho de Tormes, além o monstruoso Saturno estremece, e esse estremecimento percorre o inteiro Universo! Jacinto abateu rijamente a mão no rebordo da janela. Eu gritei:
- Acredita! ...O sol tremeu.

Passagens de "A Cidade e as Serras" de Eça de Queiroz

Ó noite


Ó noite onde as estrelas mentem luz, ó noite, única coisa do tamanho do universo, torna-me, corpo e alma, parte do teu corpo, que eu me perca em ser mera treva e me torne noite também, sem sonhos que sejam estrelas em mim, nem sol esperado que ilumine do futuro.

Fernando Pessoa

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