sábado, 17 de setembro de 2011

Borboletas


Hoje, prefiro cantar as coisas simples, as que
crescem depressa, como os ciprestes, ou as
que se enrolam a tudo o que aparece nos muros
como as buganvílias. Através delas, vejo o céu
que me traz outras coisas, mais complicadas
dos que estas da terra; e também no céu
escolho, hoje, o que não é difícil, a nuvem
que há pouco parecia eterna e desapareceu;
ou um branco sujo que apagou o horizonte,
por algum tempo, e fez com que todo o
universo ficasse ao meu alcance para nada.

Mas o que é simples também pode ser o
seu contrário. Há uma lógica no interior
deste movimento que faz crescer o cipreste,
ou empurra a buganvilia para o fundo do muro;
e também as nuvens seguem uma direcção
precisa, mudando a sua forma à medida que
se afastam dos meus olhos. A verdade deste
mundo encontra-se no próprio acaso que
a determina; e sou eu que tenho de encontrar
as razões para o que não precisa delas,
porque a sua existência se limita a este
perfume de fim de verão, ou à queda
das folhas que se confundem com nuvens.

O mundo é imprevisível como a vida
da borboleta que nasceu de dentro da
buganvilia; mas o vento que há pouco soprava,
não me disse nada sobre isso, nem o seu
sopro vago me libertou de folhas e de
nuvens, para que o chão e céu ficassem
limpos. Só a borboleta, no instante do voo,
trouxe a sua luz dissonante para dentro
da natureza; e foi ao encontrá-la,
no meio da terra e das pedras do jardim,
que me apercebi de que nem tudo é simples,
quando a morte se cruza com a beleza.

Nuno Júdice

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